Tem gente que se obriga a gostar da mãe mesmo que ela nem mereça ser assim chamada, mas não há maior exemplo de verdadeiro e completo amor pela mãe do que na noite do Rio. É na penumbra, entre copos de bebida, beijos roubados e baforadas de cigarros vagabundos, que se encontram os maiores exemplos de amor pelas mães. É um amor que nasce, consolida e, de certa forma, se sacrifica nos corações, nos gestos e até nas atitudes de gente humilde. Nas chamadas classes mais altas, nas quais cada um pensa, infelizmente, muito mais em si do que no próximo, o amor pela mãe também é completo, sincero, mas menos demonstrado e mais obrigatório. Gostar da mãe é, muitas vezes, apenas uma obrigação social. No coração das chamadas “meninas da noite” esse amor é mais inteiro, mais real, menos obrigatório. Basta conversar com meia dúzia de “meninas da noite” para perceber isso nitidamente. Elas estão ali vendendo o corpo (expressão terrível, mas verdadeira) com a preocupação maior de conseguir dinheiro para suas mães. O conforto que elas, essas mães, certamente nunca tiveram. Um digamos sacrifício fácil de entender: é nas mães que essas filhas sempre encontraram o maior apoio fizessem o que fizessem. Dos pais elas tem, quase sempre, uma imagem negativa de violência (geralmente contra as mães) e de alcoolismo. Às vezes essa história de estar trabalhando para “ajudar a mãe” é, como são tantas outras na noite, mentirosa, mas na maioria das vezes o que se ouve e se vê é a mais absoluta verdade. Gente humilde (repare aí no seu trabalho) costuma expressar, em qualquer lugar, muito mais o seu sentimento simplesmente porque não tem vergonha de amar e muito menos de mostrar esse amor, mesmo que isso possa parecer ridículo (afinal todo o amor é, felizmente, ridiculamente piegas) . Em qualquer trem de subúrbio a sacrificada operária será sempre um exemplo de amor. Principalmente amor pela mãe, mãe que às vezes a jovem e sofrida operária também já é, mesmo que o tenha sido por um acidente.
No balcão do bar que costumo frequentar (todo mundo tem seu bar preferido) a jovem garçonete conversa com uma amiga. Sozinho - todo frequentador assíduo do mesmo bar geralmente é um solitário - presto, copo de chope na mão, atenção a conversa e descubro que com os pouco mais de trezentos reais que a jovem e sacrificada garçonete recebe mensalmente já deu para a mamãe uma televisão, geladeira, vídeo cassete, som, enfim tudo o que possa supostamente, diminuir o sofrimento de uma vida inteira de sacrifícios. Para a jovem garçonete, cheia de prestações a pagar, não sobra quase nada. Sobra sim o prazer maior de estar dando para a mãe “tudo o que ela merece”. Nas “meninas da noite” encontro o mesmo desejo de ajudar a mãe e o mesmo prazer de conceder, inclusive de forma material, esse amor, mesmo que precisem mentir o amor em um doloroso sacrifício para seu corpo exercendo uma profissão do qual geralmente as mães nem desconfiam. Esse prazer de amar as mães (deve ser o único amor de verdade que elas sentem) é que faz deliciosas essas filhas da mãe. Porque, afinal, o verdadeiro amor (amor sem egoísmo) é aquele que quer ver a pessoa a quem se ama feliz. É só isso o que essas deliciosas filhas da mãe querem.
*E conseguem.
segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário