terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Povo mágico

                                     

                   O brasileiro é um mágico. Faz mágica para sobreviver com um irrisório salário mínimo. Faz mágica para vencer o desemprego. Faz mágica para alimentar-se adequada ou, quase sempre, inadequadamente. Faz mágica para mostrar-se alegre e otimista, mesmo quando não há nenhum motivo para isso. Faz mágica para continuar tendo esperança porque na maioria das vezes é só o que lhe resta. O brasileiro é um povo mágico e nem os mais perfeitos e respeitados ilusionistas do mundo são tão bons mágicos quanto qualquer um de nós. O brasileiro é o rei da ilusão. Vive em função literalmente em função do próprio ilusionismo.

                         Quando se anda pelas ruas é fácil e surpreendente descobrir todo o tipo de mágica, mas uma das que certamente mais chama atenção é a mágica dos camelôs que fazem surgir do nada os mais diversos produtos. A gente sai de casa com uma manhã ensolarada e, de repente, o tempo muda e nos deixa debaixo d’água. Imediatamente, como num perfeito passe de mágica, os camelôs que vendiam pilhas, radinhos, lupas, isqueiros e os mais diversos (às vezes até estranhos) produtos, passam a oferecer guarda-chuvas que nunca se sabe de onde milagrosamente aparecem e muito menos em que local ficam escondidos esperando a hora de entrar em ação. Dá até a impressão de, que, como a chuva, eles caem do céu.
              Essa magia urbana não acontece só quando chove. A magia dos camelôs se faz presente a todo momento, a cada necessidade imposta pelo, digamos, mercado consumidor. Dependendo da oferta de ocasião qualquer produto aparece sem que imaginemos de onde. No fundo é a necessidade de vender para sobreviver o grande segredo dessa mágica. Um truque perfeito Mas a mágica maior dos camelôs é financeira (mágica que aliás, nenhum ministro da Fazenda é capaz de fazer) que é a de conseguir vender tudo ou quase tudo a um real. Por conta dos camelôs esse passa a ser, em qualquer esquina, o país irreal do um real. Com um real compra-se um diversificado tipo de produtos, como se um real fosse,v isoladamente, realmente dinheiro.De real em real pode-se até chegar alguma coisa. Mas com apenas um real só se chega ao camelô, aos produtos nada confiáveis. Ao nada.
          É inexplicavelmente encantadora a mágica (mágica inclusive para escapar da fiscalização, como se fossem bandidos e não trabalhadores sem qualquer outra alternativa) dos camelôs que fazem de nossas ruas o mais popular e até encantador shopping do mundo a céu aberto. Essa mágica urbana e diária é a demonstração maior de que o brasileiro é sempre um mágico, capaz de dar um jeitinho (aquele jeitinho que é característica brasileiríssima) na hora de enfrentar as necessidades impostas pela vida. Pela absoluta falta de perspectivas. É até aceitável e digno de elogio o poder criativo do brasileiro de dar sempre “um jeitinho”.Mas o que precisamos mesmo é que esse país não precise viver de mágica e tome jeito de verdade.

* Definitivamente  (Eli Halfoun)

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