quarta-feira, 14 de março de 2012

CRÔNICA----- Algemas modernas

Liberdade é sempre a palavra de ordem. Estamos todo o tempo buscando ou sonhando ser livres (livres em e para tudo), mas nos fazemos cada vez mais prisioneiros, amarrados e cerceados por algemas modernas que nos limitam o sonho total e maior de liberdade. Tornamos-nos prisioneiros do tempo, da modernidade e das máquinas.
Além da prisão domiciliar a que nos condenou e condena cada vez mais a inesgotável violência e, em conseqüência, o medo de sair (principalmente quando escurece) e de caminhar tranquilamente pelas ruas em paz estamos acorrentados pelas máquinas que se por um lado nos facilitam a vida, por outro nos bloqueiam a liberdade de usá-las quando queremos e precisamos e não somente quando elas, as máquinas, permitem. Quando não deixam acabam nos levando quase ao desespero porque de uma forma ou de outra nos bloqueiam os passos, o raciocínio e a vida.
É do inevitável computador (máquina e ferramenta obrigatória nesses dias corridos e modernos) que estamos mais dependentes e, portanto, prisioneiros. Se a máquina deixa de funcionar (e quando menos se espera ela pára) nossa vida também fica congelada, bloqueada, sem rumo. Praticamente “deletada”. É no computador, que tem memória, mas não tem como nós, cérebro, que grande parte de nossas vidas está arquivada e não é sempre que se pode arquivar a vida. Ou parte dela.
Fora do ar o computador nos deixa também completamente aéreos sem saber o que fazer, como agir e permitir que a vida pessoal e profissional continue normalmente. A falha do computador chega a ser cruel: ficamos nervosos, impotentes e desesperadamente limitados. Impossibilitados de seguir em frente.
O computador, que é hoje, de cetra forma, também uma parte de nosso corpo e de nossa alma, não é a única máquina que ao mesmo tempo em que às vezes nos liberta também nos aprisiona, nos deixa sem rumo. Todas as outras máquinas que os tempos modernos nos obrigam a ter em casa, também nos deixam sem saber o que fazer quando inesperadamente, param de funcionar. É para quase um tormento quando, por exemplo, a televisão pifa. A sensação é a de que ficaremos mais isolados, mais solitários, sem ter absolutamente o que fazer para ajudar o tempo passar. A televisão é hoje a companheira mais constante (quase obrigatória) de cada um de nós e, para muita gente, a única alternativa de lazer mesmo que na maioria das vezes não seja um lazer tão saudável assim.
As máquinas (até um simples liquidificador, torradeira ou radinho de pilha) estão nos dominando cada vez mais e já da para pensar qual tipo de prisioneiros seremos no futuro se não aprendermos a viver sem as máquinas. Elas nos facilitam a vida, mas também nos fazem esquecer que a vida não é uma máquina movida por outras máquinas e que é preciso reaprender (reaprender com urgência) seguir em frente sem as facilidades que as máquinas oferecem e permitem. Até porque a vida não é tão fácil assim e se fosse não teria, convenhamos, a menor graça. O melhor da vida é vencer as dificuldades. Principalmente sem a ajuda das máquinas.
Uma máquina defeituosa é um desacerto total: muitas vezes afeta de uma só vez um grande número de pessoas. Como aconteceu, dia desses, quando a tomografia computadorizada de um movimentado laboratório de análises, pifou e promoveu um transtorno inacreditável. O laboratório parou de funcionar, quem tinha exames marcados teve que ser transferido para outras e distantes unidades ou para outro dia. A máquina tomou conta da situação, impôs o seu ritmo, que naquele momento era nenhum, e atormentou a paciência de todos. Como também costuma acontecer quando se vai a um banco em busca de alguns quase sempre miseráveis trocados, e o sistema deixa de funcionar prendendo nosso suado dinheirinho até a hora que bem entender e nos deixando acorrentados, sem poder fazer mais nada.
Não se pode, evidentemente, desprezar, desconhecer e simplesmente abrir mão da utilização das máquinas, mas é preciso buscar alternativas antes que as máquinas nos dominem completamente, nos algemem definitivamente e nos digam, quando e o que podemos fazer. Caminhar livremente é preciso. Sempre e de qualquer forma. (Eli Halfoun)

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