quarta-feira, 24 de março de 2010

CRÔNICA -- Olhar de paz

Olhar de paz
Em jornalismo se aprende cedo, mais na prática do que na teoria, que as notícias envelhecem rapidamente, especialmente quando todo mundo resolve escrever sobre o mesmo assunto. Foi assim recentemente no aniversário das revolução de março que nos traz, infelizmente, tristes e cruéis recordações mas que é inegavelmente uma fato histórico quer não podemos esquecer para evitar que se repita.
Exatamente porque todo mundo falou, e repetidas vezes, sobre a guerra da Rocinha é que eu não queria também falar sobre o absurdo acontecimento. Tenho uma teoria, que para muitos é absurda, de que nós da imprensa fazemos uma espécie de, digamos, marketing da violência e do tráfico e, em consequência, também o marketing do medo. Quanto mais se fala em violência ( e parece que o assunto é, hoje em dia, inevitável) mais apavorada se deixa a população, que precisa, sim, ser protegida e alertada, mas não amedrontada, como se faz na maioria das vezes. O medo da população é uma das mais potentes munições de quem comanda e incentiva a violência
Já é hora também de para de abrir e gastar espaço com autoridades que se aproveitam dos fatos para aparecer e só apresentam, até porque nada de bom tem para falar, soluções inviáveis e que nunca serviram para diminuir a violência e a fome, uma das causas dela. Pelo contrário: ela, a violência, tem aumentado... e muito. Assim o assunto violência-tráfico será sempre uma notícia atual porque não tem a menor perspectiva de tornar-se assunto requentado. Isso só acontecerá quando a violência tiver realmente um fim, o que pelo que se vê e se lê, está longe, muito longe de acontecer.
Da janela do meu quarto avisto um morro( de qual janela do Rio de Janeiro não se avista um, morro e como ele o medo?). É verdade que ainda há, no morro que avisto, uma parte muito verde ( saudavelmente verde) e que ainda não virou “condomínio de violência. Sou de um tempo romântico ( e nem sou tão velho assim) em que avistar um morro através da janela de seu apartamento, era ter uma vista bonita, agradável até, de cara para um verde que nos deixava respirar ar puro. Hoje já nem se pode respirar.
Sou daquele tempo em que ver os barracos coloridos espalhados pelo morro era uma paisagem - paisagem, que corre o mundo através de artistas populares que fazem do morro inspiração para a arte de lindos quadros, vendidos da feira hippie e espalhados pelos turistas em vários países e por aqui mesmo em muitos e luxuosos apartamentos. É verdade que tem - e como tem- muita gente boa morando nos morros e tentando fazer dos locais uma comunidade social de bem com a vida. Mas esses moradores, coitados, estão sendo obrigados a deixar para trás os barracos ( único teto, às vezes estrelado, que conseguiram para viver) porque não há mais como ficar e tentar estar de bem com a vida. É a morte que os ameaça, como a todos nós, o tempo todo, todo o tempo. Não cabe aqui nesse espaço fazer qualquer proposta para dar um basta a essa violência sem fim e nem acabar, como já se propôs e até já se fez, com os morros. A violência desceu para o asfalto há bastante tempo e se lá em cima, é ,como se tem mostrado em imagens assustadoras, impossível fazer qualquer coisa, é preciso cuidar, cuidar muito, para evitar que a violência no asfalto se agrave cada vez mais e nos faça virar soldados-vítimas, de uma guerra que não queremos. Eu quero ver o morros outra vez com romantismo, com beleza, sem medo e com a certeza de que a guerra ( pelo menos essa) acabou
* Guerra que parece interessar a muita gente. E não só nos morros

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