domingo, 21 de março de 2010

CRÔNICA -- Esperança Única

Naquela manhã de domingo o sol brilhava mais intensamente, contrariando a previsão de tempo nublado (a meteorologia nunca acerta) como se também quisesse homenagear o dia das mães. Era dia de festa, mas para muitas mães um dia de esperança, de possibilidade de acabar com o desemprego e de melhorar de vida. No portão da Universidade Veiga de Almeida, na Tijuca, muitas mães, muitos pais e muitos jovens filhos se aglomeravam em imensa fila para realizar mais um dos muitos concursos públicos que têm sido oferecidos ultimamente. E é só o que se oferece. Dos mais dos dois mil inscritos que ali estavam pouco mais do que vinte conquistariam o emprego que tanto precisam e com o qual tanto sonham.
Na minha frente (eu também estava lá) duas bonitas moças conversavam apressadamente como se assim pudessem espantar o nervosismo que uma prova impõe a qualquer concorrente. Deu para ouvir que eram recém formadas e que, mesmo com diploma na mão, não tinham conseguido qualquer chance e agora procuravam a esperança da suposta estabilidade do emprego público.
Os milhares de candidatos que participam de concursos públicos não são só o retrato do desemprego e dificuldades de vida. A busca de uma vaga através de concurso público é também, deu para perceber em todas as conversas, o reflexo da insegurança profissional que, como o desemprego, toma conta – e cada vez mais – do país. Ninguém mais acredita que por melhor profissional que seja tenha emprego garantido por muito tempo.
O emprego público ainda é a garantia maior de “não ser demitido” e a esperança de uma razoável aposentadoria na velhice. Não é mais bem assim: o servidor público tem sido prejudicado, usurpado até, em seus direitos, mas ainda é o emprego público (num país que não permite ou oferece outras oportunidades) que garante suposta estabilidade. .
É por isso que tanta gente estava lá na fila da Universidade, buscando não um diploma e uma vaga, simplesmente, mas sim a esperança de dias melhores. Provavelmente se uma das duas belas e diplomadas moças que estavam na minha frente forem “premiadas” com o emprego público certamente esquecerão o diploma no fundo de uma velha gaveta e o Brasil estará ganhando (como se realmente precisasse) mais dois funcionários públicos, mas perdendo duas médicas, duas advogadas, seja lá em que tenham se formado.
Concurso público é também festa para camelôs: lá estavam eles aos montes vendendo canetas, lápis, borrachas, refrigerantes, guloseimas. Camelôs são bem informados e sempre estão em qualquer lugar em que haverá um provável grande número de clientes. O que me levou a pensar que quem não for classificado em concurso público pode virar camelô. Não chega a ser um emprego estável, mas em um país de cada vez mais desempregados não deixa de ser uma tentativa digna de pelo menos tentar garantir o feijão e arroz de cada dia. Do jeito que caminham as coisas vamos todos, mais dia menos dia, virar ambulantes.
* Só faltará quem compre
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