terça-feira, 24 de janeiro de 2012

CRÔNICA ----- Livre escolha

Até recentemente pegar um táxi significava na maioria das vezes submeter-se a uma tortura auditiva. Parecia praga: todos os táxis estavam com o rádio sintonizado em um dos ridículos programas policiais que já estiveram na moda ou em uma dessas emissoras que primam pelo mau gosto musical. Qualquer corridinha de 15 minutos era um martírio que nos fazia sofrer praticamente o dia inteiro, como se aquele som maldito som ficasse impregnado na alma do passageiro. Confesso que embora me fosse absolutamente necessário eu tinha pavor de andar de táxi (quando o físico aguentava preferia fazer meu roteiro caminhando).
Esse pavor diminuiu um pouco no dia em que (sorte minha) entrei em um táxi que para minha grata surpresa e supremo alívio estava sintonizado em uma emissora deixando ouvir o suave som da música clássica (ou seja, música de verdade).
Claro que estranhei e como repórter a pergunta se fez inevitável ao motorista paraibano: “O senhor conhece música clássica?”. O motorista, um senhor humilde de e com os cabelos embranquecendo respondeu com a sinceridade das pessoas simples: “Não conheço e ainda nem sei se gosto, mas tenho certeza de que de tanto ouvir esse som bonito e gostoso vou gostar e conhecer”.
O episódio vem à memória quando acontecessem, - e acontecessem todos os dias – discussões em torno da discutível qualidade de programação oferecida pela televisão. Existem exceções, mas na maioria das vexes são programas de baixo nível e as desculpa é sempre a mesma: “damos ao público aquilo que ele quer e gosta”. Não é bem assim: essa é apenas uma maneira de condenar o público menos exigente ao mau gosto e a engolir de o que a televisão impõe, porque, afinal, ele, público, é o culpado por gosta das coisas ruins. A verdade é que sem (ou com pouquíssimas) opções e inteligência e consequentemente de qualidade o povo fica refém do mau gosto e do que lhe oferecem como se estivesse mesmo pedindo isso.
Pesemos vem conjunto: será que se houver uma melhor oferta o público não aprenderá e conhecerá (como o sábio motorista de táxi) táxi faz com a música clássica?) Só conhecendo o que é bom é possível gostar do que é bom. O problema é que em quase tudo só se dá ao povo, o que é ruim e o quer existe de pior. O povo consome a sobra das sobras e por isso mesmo é só o quer fica conhecendo o que é ruim. Negam-lhe quase sempre a oportunidade de aprender a gostar do que é bom e a partir daí fazer a opção que lhe convier.
A discussão sobre o papel e a qualidade da televisão é sem fim e aparentemente sem solução. Aliás, como quase tudo em um país em que se fala muito e se resolve pouco.
A televisão, assim como todo o resto, só mudará quando pararmos de culpar as chamadas classes inferiores (o que é outra agressão aos menos afortunados) pela má qualidade dos programas de televisão e principalmente de responsabilizá-los pela má qualidade de vida que são obrigados a ter por absoluta culpa dos que ainda acreditam que o ruim já está muito bom para quem não tem nada.
Em relação a televisão e a vida de uma maneira geral convém lembrar a lição de um diretor francês que diz: “A televisão não pode e não deve oferecer ao público aquilo que ele quer, mas sim aquilo que ele pode vir a gostar e a aprender”. Afinal, só conhecendo o que é bom é que podemos escolher o que é melhor. Em tudo. (Eli Halfoun)

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